“Passavam carros eléctricos, automóveis e carroças, muitas carroças, em cujos condutores reconheceu também vozes de portugueses. «Todos iam arranjando a sua vida, menos ele! E quem sabe? Quantos outros haveria que nem uma carroça…»
“No cais, lá estavam os escaleres dos poveiros, com um pouco de água a estremecer no fundo e encharcadinhos de sol.” (1)
Estes poveiros, de Ferreira de Castro, arribariam a Porto Alexandre em 1921.
“A ida dos pescadores da Póvoa de Varzim para Angola e Moçambique está relacionada com a emigração dos poveiros para o Brasil. Em 1920 as autoridades brasileiras determinaram que os pescadores estrangeiros só poderiam continuar a actuar nas águas do Brasil desde que: se naturalizassem brasileiros até 12 de Outubro do referido ano; nacionalizassem as suas embarcações; organizassem «companhas» de modo que dois terços da tripulação de cada barco fosse brasileira.
“Os pescadores da Póvoa de Varzim obedeceram às duas últimas condições arvorando nos seus barcos a bandeira do Brasil e pedindo, através de editais, a colaboração de tripulantes brasileiros. Mas como, na sua quase totalidade, se escusaram à naturalização, tiveram de regressar à Póvoa, em número de cerca de mil. Em 30 de Outubro de 1920 chegou a Lisboa o primeiro contingente de 250 pescadores, seguindo-se-lhes outro grupo, de 302, desembarcados em Leixões em 5 de Novembro…
“Embora com os marítimos da Póvoa de Varzim tivessem regressado do Brasil - e pelos mesmos motivos - pescadores de outros lugares da nossa costa, o conjunto poveiro sobrelevou, em amplíssima escala, os pequenos contingentes dos restantes centros. Daí o facto de na Póvoa de Varzim se virem a sentir de um modo mais dramático os problemas sociais e económicos derivados do retorno de tão grande massa de indivíduos, para cuja utilização nada estava preparado. Extintos os ecos da recepção calorosa e romântica, cedo se verificou que uma crua miséria enlaçara bastantes dos que haviam voltado, e ameaçava muitos mais, tornando-se urgente a tomada de medidas que evitassem tamanha e injusta desgraça…”
Por outro lado, Norton de Matos que queria “assentar no litoral do sul de Angola as bases de uma indústria piscatória voltada para o futuro, lançou a ideia da instalação de uma colónia de poveiros em Porto Alexandre, facilitando a solução de todos os pormenores decorrentes da sua proposta.
“Em 24 de Fevereiro de 1921, no paquete África, partiam de Lisboa para Porto Alexandre 62 dos pescadores poveiros regressados do Brasil, que chegaram ao seu destino em 14 de Março; à frente tinham sido enviados os seus barcos e aprestos, que às praias africanas levavam, pela primeira vez, elementos típicos do areal e da enseada da Póvoa. Entretanto o General Norton de Matos mandara construir em Porto Alexandre um bairro destinado às famílias dos pescadores poveiros, a fim de as atrair e fixar ao solo de Angola.” (2)
“Um dos pescadores poveiros idos para Porto Alexandre, Manuel Francisco Trocado , dizia em carta dos finais de 1921: “Acrescentarei ainda que o sistema de pesca que adoptamos é muito fácil: fizemos uma sacada, como uma nassa, que nos importou em 2 contos. Lança-se ao mar, seguras as extremidades por 2 barcos, e em um, ou, no máximo em dous lanços, carregamos o barco de peixe”. (3)
pesquisa e texto complementar de Admário Costa Lindo
1 CASTRO, Ferreira de. A Selva, Livraria Editora Guimarães & Cª , Lisboa, 1957 (18ª edição), p. 75
2 GONÇALVES, Flávio. Os pescadores poveiros em Angola e Moçambique , Póvoa de Varzim Boletim Cultural, volume VI nº 2, C.M. da Póvoa de Varzim, 1967. pp. 286/288
3 “O Comércio da Póvoa de Varzim”, 11/10/1921.
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